Lenir é mãe, esposa, filha, profissional, amiga e mulher. Lenir, assim como outras milhares de mulheres, enfrentou e venceu o câncer. Lenir é uma sobrevivente e essa é a história dela
Entrei na sala dela pela primeira vez. Ela me recebeu com um sorriso largo e acolhedor e, visivelmente emotiva, começou nossa conversa com um pedido de desculpas pelo nervosismo, o que me pareceu um tanto quanto fora de lugar. Afinal, o invasor ali, como em diversas ocasiões, era eu: o jornalista atrás de uma história para contar.
Mas assim ela é. De uma simpatia tremenda que transpassa a você no instante em que a conhece. Ali estava Lenir Gaik, minha colega de trabalho e que se dispôs a falar sobre um tema tão sensível a mim, um relativo desconhecido. Haja responsabilidade.
Confesso que Lenir não foi escolhida ao acaso. Ela, assim como outras milhares de mulheres, teve câncer de mama. Mas não somente isso, pois o enfrentou e o venceu. Lenir é uma sobrevivente, mas isso não a define. Ela é mãe, esposa, filha, profissional, amiga e mulher. Lenir é uma vencedora.
A descoberta
“Em 2020 eu estava grávida”, inicia Lenir. Ela conta que teve uma gestação turbulenta. “Acredito que foi uma alteração hormonal que me deixou assim. Me sentia mal, inchada, sem disposição e cansada durante toda a gestação”, relata.
A chegada precoce da filha serviu para ligar o sinal de alerta para Lenir. “Isabela nasceu prematura, com sete meses, mas tudo certinho. Minha bolsa estourou em casa e somente fui ao hospital algumas horas depois. O problema é que mesmo após a gravidez eu continuava com um esgotamento físico acentuado. Eu sentia que tinha algo diferente em mim”, afirma.
Nesse período, alguns sintomas da doença começaram a surgir. “Eu perdia bastante cabelo e minhas unhas estavam quebradiças. Pensava ‘devo estar com a imunidade baixa’, mas nunca me passou pela cabeça que teria câncer. Até que um dia, enquanto estava no banho, notei um caroço muito visível em meu seio direito. Nunca havia feito o autoexame, mas aquilo estava evidente. Saí do banho e, logo em seguida, entrei em contato com o médico”, pontua.
Importância do autoexame
Kamila Cerbaro Cezario, coordenadora do curso de Biomedicina da UCEFF, destaca a importância de se fazer o autoexame de mama rotineiramente. “Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca) o câncer de mama ainda é um dos cânceres mais comuns, ficando atrás somente do câncer de pele não melanoma, e é o câncer que mais mata mulheres”, frisa.
Ela explica que assim como todos os outros tipos de câncer, é uma doença resultante da multiplicação de células anormais da mama que formam um tumor com potencial de invadir outros órgãos. “Há vários tipos de câncer de mama. Alguns se desenvolvem rapidamente e outros de forma mais lenta, com diagnóstico mais difícil. A maioria dos casos tem boa resposta ao tratamento, principalmente quando diagnosticado e iniciado o tratamento rapidamente”, enfatiza.
Conforme Kamila, é crucial que a mulher redobre a atenção caso possua histórico de câncer de mama na família. “Caso sinta algum desconforto ou algum caroço, procure o médico de confiança para melhor avaliação. Não deixe de se cuidar”, aconselha.
O diagnóstico
Chovia muito no dia de nossa entrevista e nos momentos em que o silêncio tomava conta da sala em que estávamos, podia ouvir as torrentes que caíam no telhado e o vento a forçar a entrada pelas frestas de alguma porta. Climas tempestuosos sempre me deram frio na espinha, mas esse momento da história, em que uma tempestade chegou na vida de Lenir, fizeram os pelos do meu braço arrepiarem muito mais do que qualquer trovão.
“Após os exames, recebi o diagnóstico de câncer de mama no dia 18 de fevereiro de 2021”, lembra Lenir. Ela conta que a partir daquele momento se iniciou a maior luta da vida dela. “Comecei imediatamente os exames e descobri que o câncer que tinha era de um tipo muito agressivo, que cresce rápido e se alastra com facilidade. No dia 21 de março eu comecei a fazer a quimioterapia”, afirma.
O tratamento
Após o diagnóstico, Lenir iniciou o tratamento que consistiu em seis sessões de quimioterapia, além de uma cirurgia para retirada das mamas. Ela frisa que a parte mais difícil foi lidar com os efeitos colaterais. “Eu respondi 100 por cento ao tratamento. Sei que foi tão eficaz pois quase morri no processo. Perdi todo o meu cabelo e as unhas. Saíram feridas do tipo de queimaduras pelo meu corpo. Hoje só consigo estar aqui por meio de remédios. Foi um pesadelo”, enfatiza.
De acordo com a coordenadora do curso de Enfermagem da UCEFF, Tifany Colome Leal, os enfermeiros atuam em três vertentes no tratamento de pacientes de oncologia. “Os profissionais vão atuar principalmente na prevenção, mas também no tratamento e reabilitação dos pacientes. É muito relevante a presença do profissional de Enfermagem justamente por essa busca de diagnóstico mais precoce”, detalha.
Tifany salienta que os enfermeiros trabalham nos centros de saúde com campanhas educativas e de orientação no viés da prevenção. “Hábitos saudáveis, como alimentação, atividade física, não praticar o tabagismo, entre outros, podem diminuir o risco da mulher ter um câncer. Portanto, o enfermeiro vai auxiliar na prevenção, mas quando detectado, ele orientará o início do tratamento e auxiliará na administração dos medicamentos, consultas, orientações e tudo o que o manejo do tratamento do câncer implica”, explica.
Ela aponta que os profissionais vão dar atenção aqueles que venceram a doença. “O processo de reabilitação é muito importante, pois quando essa mulher já passou pelo câncer e vai seguir a vida, é importante que continuemos no acompanhamento para garantir que ela tenha saúde”, ressalta.
Cuidado com a mente
No caso de Lenir, o diagnóstico precoce aliado ao tratamento imediato foram cruciais para enfrentar e vencer o câncer. Mas isso não diminuiu as dificuldades que um tratamento incisivo implica. Com lágrimas nos olhos, Lenir contou que a quimioterapia foi um teste de sobrevivência. “O período das seis quimioterapia foi o mais cruel da minha vida. Não conseguia comer, ou fazer coisa alguma. Foram sete meses muito cruéis, mas acabaram. Então, no dia 23 de agosto, retirei as duas mamas para não ter perigo de no futuro retornar”, diz.
Nesse momento, é crucial ter ao lado profissionais que possam auxiliar a enfrentar a doença. A coordenadora da Clínica Escola de Psicologia da UCEFF, Valéria Viera de Figueiredo, o papel do psicólogo diante do processo de diagnóstico do câncer é fundamental. “Temos uma especialização que é a psico-oncologia, na qual vamos tratar e cuidar desses indivíduos que são diagnosticados desde o princípio, quando ainda existe a dúvida do diagnóstico”, aponta.
Ela frisa que a partir do momento que o paciente recebe o diagnóstico ele fica desorganizado emocionalmente. “O câncer é visto como sinônimo de uma morte breve e o psicólogo precisa estar próximo para auxiliar nesse processo de aceitação, de fortalecimento para enfrentar a doença, bem como, auxiliar a elaboração do luto do corpo saudável e compreender que é um período que vai passar, que terá um fim”, destaca.
Valéria entende que o profissional de psicologia possui a função de educar, acolher a dor e auxiliar no processo de tratamento. “Trabalhar com pacientes da oncologia é lidar diariamente com sentimentos diferentes como esperança, ansiedade, desmotivação, depressão, saudade, confiança, entre outros. O psicólogo é essencial para auxiliar na saúde mental, pois nossa mentalidade reflete diretamente em nossa recuperação e saúde física”, conclui.
A cura
Lenir relata que ainda há mais 12 sessões de imunoterapia para serem realizadas. “Vou terminar esse tratamento na metade do ano que vem. Mas graças a Deus as biópsias feitas após as quimioterapias todas apontaram negativo para câncer e estou livre disso. Eu estou me sentindo muito bem”, ressalta.
Ela salienta que um dos remédios mais importantes para a cura dela, não veio de nenhum laboratório. Ela agradece imensamente o apoio da família e colegas que não a deixaram desistir.
“Quando eu descobri o câncer, minha filha tinha sete meses. Minha família não é daqui, mas minha mãe veio para Chapecó me ajudar, cuidar de mim e sofrer juntamente comigo. Fiquei muito tempo afastada de minha filha, mas aprendi muito com ela. Mesmo que minha filha não entendesse, ela cuidava de mim do jeito que ela podia. Eu fui forte por eles, pois eles foram fortes por mim. Só tenho a agradecer minha família, minha mãe, meu marido e minha filha que ficaram ao meu lado, bem como, a UCEFF e meus colegas que me deram todo o apoio que precisei nesse período. Eu venci o câncer”, finaliza.